Crônicas de um Celepariano em NY (3ª PARTE)
As pessoas continuam dizendo que estão acompanhando minhas peripécias em terras estrangeiras. Então enquanto houver leitores, segue a história,Eepisódios pitorescos é que não faltam.
Hoje vai-se começar pelo embarque. Sabe como é, marinheiro de primeira viagem, não deixei nada ao acaso. Dois meses antes, já tinha o passaporte, o visto, a passagem, os dólares, a matrícula na escola, certidão de vacinação, só faltou mesmo uma recomendação do Papai Noel dizendo que eu era um bom menino.
Tudo visto, olhado, verificado e conferido, três vezes. A única coisa que lamentavelmente deixei de olhar foi a data da passagem. Na minha cabeça, sabe-se porque cargas d'água, eu embarcaria dia 20 de maio, sábado. Só que na passagem estava escrito (há mais de 1 mês), dia 19 de maio, sexta-feira, às 17:00.
Pois chegou a sexta-feira, e eu tranquilamente aqui na CELEPAR, achando que viajaria no dia seguinte. Estava tão tranquilo, que mais para o fim do expediente, dei um pulo na agência da mulher do nosso colega Azevedo, para buscar um guia turístico de Washington. Tudo na maior calma, pois afinal eu só viajaria no dia seguinte.
Cheguei na agência às 16, e notei que todo mundo tava me olhando de um jeito meio esquisito. Claro, a Cristina (mulher do Azevedo) e os funcionários se perguntavam: "o que esse maluco tá fazendo aqui? Devia estar no aeroporto". Mas o caso é que ninguém me dirigiu a pergunta fatal e eu saí tão tranquilo como tinha entrado. A Cristina, já um bocado preocupada, ligou para minha casa, querendo saber se eu já tinha ido para o aeroporto, e a minha secretária doméstica não entendendo nada, disse: "não, ele só vai amanhã".
A Cristina sabia que o avião saía em meia hora e criando coragem me ligou para a CELEPAR. "Você não vai viajar ?". E eu, na maior pachorra: "vou, amanhã". "Não é amanhã é‚ hoje, e daqui a 20 minutos..."
Levei um susto e por uns momentos dei adeus a minha viagem tão olhada, verificada e conferida (menos o dia da passagem como se viu). Que sufoco.Foi um tal de ligar para a Escola em NY, para a companhia aérea, pro taxi, para todo mundo.
No fim, tudo se ajeitou, e no sábado fui trocar a minha passagem. A companhia, com todo o direito, queria saber qual o motivo da mudança da data da passagem. A Cristina pensou, pensou e lascou um "motivo de força maior", o qual graças a Deus foi aceito pela transportadora. Fica a lição. Na próxima viagem, vou conferir o passaporte, o visto, a passagem, os dólares, a matrícula na escola, certidão de vacinação e A DATA DA PASSAGEM.
No vôo de Curitiba a São Paulo, embarca junto o baixinho daquela marca de cerveja, rodeado por meia dúzia de mulatas de parar o trânsito. Chega o serviço de bebidas e todo mundo olhando para o baixinho para ver o que ele ia pedir. Não deu outra, ele pediu a tal da cerveja. A comissária sorridente, retrucou com desculpas mas afirmou só ter a outra, a concorrente. O baixinho soltou um grito como se lhe tivessem oferecido cicuta. Fechou a cara e lascou um furioso "então me dê água", sob aplausos da mulatada e apupos do resto do avião. E eu cá comigo "essa viagem promete...".
Algumas horas depois, estamos uns 400 passageiros no saguão de Cumbica. Sai um avião aqui, outro alí, e finalmente ficam 2 aviões apenas, da mesma empresa. O primeiro, no portão 11, ia para Seul, e o segundo era o meu, para NY, no portão 13. Chega a hora do embarque e nada. Passa meia hora e mais nada ainda. Uma hora e duplamente nada. Nisso, o painel sobre o portão 13, que brilhava lindamente "Nova Iorque", se apaga. Idem, idem o painel para Seul. Percebe-se um rumor de mal estar entre a turba. Mais um instante, e o painel 13 se ilumina: Seul. Mas o 11 continua apagado. Agora, surge uma gentil funcionária da empresa e avisa: "o avião que ia para Seul está com um pequeno defeito. ("pequeno, porque não é você que vai viajar nele..."), e o avião que ia para NY agora vai para Seul. Gritos, apupos, vaias, e antes que a turba novaiorquina chegasse perto da moça, ela desapareceu como por encanto. Cria-se o maior tumulto, embarca aqui, desembarca lá, ninguém mais sabe pra onde vai cada um, e só me ocorreu pensar "só falta eu pegar o avião errado e desembarcar em Seul". Tudo esclarecido, começa o embarque no avião que ia para NY e agora vai para a Coréia. Cada passageiro que passava perto de mim, levava um olhar de "ladrão de avião alheio..."
Mais 40 minutos, e vem o aviso: "O avião de NY está pronto. Não valem mais os lugares marcados no balcão" (pois os lugares haviam sido reservados no maldito voo que já tinha saído. Aliás pela demora, nessas alturas do campeonato já devia estar perto do mar da China), e "boa viagem..."
Tinha um casal com 3 filhos pequenos aprontando a maior algazarra. O Pai muito educadamente, já tinha dado uns quantos ralhos nas crianças. Britanicamente, ele mandava elas ficarem quietas. Pois não é que quando o bom homem ouviu que os lugares marcados já não valiam, saiu urrando, pulando, gritando num pique só, atropelando todo mundo, na certa para pegar uma janelinha. Só me ocorreu pensar: "ué, cadê a fleuma britânica ?"
Embarcamos, voamos e pela manhã, NY. Desembarco e obviamente caio na fila do 3º mundo. No desembarque, tem a fila dos americanos, que aliás não tem fila, pois é super rápido, a dos cidadãos da Comunidade Européia e Japão (leia-se cidadãos ricos) e o resto. Nesse resto, infelizmente estamos nós, junto com nossos irmãos colombianos, nicaraguenses, paraguaios, zimbawenses, costaverdeanos e por aí vai.
Mais meia hora de fila e chega um momento emocionante: o primeiro pedido de informações em terras estrangeiras. Treino bem a pergunta (quase cheguei a escrever ela em um papel), estufo o peito e largo "Where can I take the downtown bus ?". Que alegria, a gentil senhorita me entendeu. O passo seguinte foi ela me responder, e aí a alegria murchou: eu não entendi absolutamente nada do que ela me disse. E foi um belo discurso... era um tal de turn left, turn right, go ahead, upstairs e eu só chacoalhando a cabeça pra cima e pra baixo. Por sorte tinha uns viajantes com cara de quem iam pegar ônibus. Fui atrás. Ainda bem que eles não estavam indo pra algum lugar exótico.
No ponto do ônibus, espera, espera e nada. Nisso surge uma van, caindo aos pedaços - obviamente clandestina - e me oferece transporte. Dentro da van, tinha um som tipo 3 em um completo (com a música na maior altura), um espelho com produtos de toucador, remédios em geral, umas guirlandas penduradas, um imenso ventilador (ligado) e um forro nos assentos feito de retalhos multicoloridos. Lembrava o táxi do filme mulheres à beira de um ataque de nervos. Não sei não, algo na esculhambação da van me deixou mais à vontade. Digamos assim, que era um pouco do terceiro mundo me acompanhando no primeiro. "let's go" pensei e fiz a pergunta óbvia "how much?".
O motorista respondeu fifteeeyy, e eu não consegui entender se era fifty (50) ou fifteen (15). E eu, hã?, e ele: fifteeeyy. E eu, hã?, e ele já ríspido: fifteeeyy. Continuei sem entender. "E agora, José‚ ?" Peço para ele escrever num papel, ou embarco assim mesmo? Relaxo, meu anjo da guarda vai me ajudar, embarco com a cara e a coragem. Mais meia hora e... Manhattan, cá estamos. Cheguei.
A propósito, eram 15.