Editorial

Nove anos do Bate Byte

 Autor: Danilo Scalet - DT    

Mais uma vez tenho oportunidade de escrever um artigo para o Bate Byte e desta feita numa ocasião duplamente especial, pois enquanto o nosso periódico comemora nove anos, a CELEPAR também vem vivendo o seu trigésimo quinto ano de atividades marcantes no contexto da informática pública brasileira. A despeito das duas datas festivas, que normalmente me levariam a relatar fatos importantes relativos às respectivas histórias dos dois aniversariantes (fatos que não faltariam, pois até mesmo manter por nove anos uma publicação técnica feita através de colaborações voluntárias, na maioria das vezes por funcionários da CELEPAR que têm muitas outras atribuições concorrentes, já é algo notável), prefiro fazer uma reflexão e propor alguns desafios.

Inicialmente, preciso afirmar que não tenho qualquer posição radical quanto à onda de informatização da humanidade, até porque é desta lavoura que tiro meu sustento há mais de vinte e seis anos. Por outro lado, sem um mínimo de avaliação crítica a respeito do assunto, corremos o risco de nos alienarmos e passarmos a ser simples consumidores de produtos da "moda", sem percebermos o efeito nas nossas organizações, na sociedade e até na nossa vida pessoal.

Nesta minha carreira profissional ligada à tecnologia da informação tenho tido a percepção que, por mais avanços que se tenham obtidos com o uso da tecnologia, ainda há uma lacuna considerável deixada de lado, principalmente olhando-se o nosso contexto de uso. Este sentimento se amplia à medida que se avaliam os investimentos realizados para se viabilizar a informatização nas organizações (investimentos iniciais, adaptação do perfil dos funcionários, treinamento, novos investimentos complementando os iniciais que sempre são insuficientes, novas versões de software que apresentam características "imprescindíveis", upgrade de hardware para sua adaptação aos novos software, custo total da propriedade, e assim por diante). Esta avaliação pode ser feita a nível das organizações, quando facilmente percebem-se processos fundamentais para os quais não estão implementadas soluções tecnológica e economicamente viáveis e que poderiam representar ganhos expressivos em gestão e operação. Esta afirmação representa um desafio ainda maior para nós que estamos envolvidos com soluções para governo, à medida que problemas "seculares" continuam pendentes na administração pública, tais como controle da sonegação de impostos, gestão das despesas de pessoal, racionalização de despesas de custeio, avaliação de recursos aplicados pelo estado em comparação com os benefícios obtidos pela sociedade, etc. O mesmo problema pode ser observado quando se avalia a contribuição da TI numa sociedade como a brasileira, considerando-se a possibilidade de maior apoio na implementação de programas sociais. Considere-se o que ainda pode ser feito utilizando-se TI nas áreas da Saúde, Educação, Segurança e mesmo nas atividades ligadas às ações de amparo social. Parece ser um desafio interessante, que ultrapassa os limites de automatizar atividades que possam representar "apenas" maiores lucros para as organizações que vendem soluções de TI.

Outro aspecto que me chama a atenção e que tem sido objeto de intensos debates com gerentes da CELEPAR é a questão de produtividade e qualidade. Novamente, fico com a sensação de que, por mais que se tenha avançado, o caminho a percorrer é ainda muito longo e potencialmente riquíssimo. Fico imaginando algumas justificativas para esta relativamente lenta evolução (relativa principalmente por tratarmos de uma tecnologia cujo fundamento é a produtividade). A primeira e já fartamente divulgada é a de que o próprio uso da TI introduz alguns fatores de redução de produtividade, tais como desvio da atenção da tarefa pela característica lúdica apresentada por um computador, a necessidade de aprendizado de outras funções não inerentes à própria tarefa, tempo dedicado a prestar ou receber suporte ao uso do computador, paradas de sistemas, etc. Estes efeitos evidentemente não estão restritos a pessoas que não sejam profissionais de TI. Considero até que os profissionais de TI são afetados mais profundamente por estes fatores. Evidentemente que esta observação não defende a restrição ao uso de computadores, trata-se apenas de um alerta quanto a alguns efeitos colaterais ainda não resolvidos. Outra questão que me parece relevante no que diz respeito à nossa produtividade de profissionais de informática é a profunda cultura do desperdício existente (inclusive de tempo). Lembro que nos "velhos tempos", em que recursos computacionais eram escassos, este desperdício era menos flagrante e até havia um esforço de economia de recursos (o "Bug do milênio" que o diga). Temo que o processo de geração de obsolescência programada de hardware e software que, mesmo tendo levado a grandes progressos na área, absorvendo evidentemente quantias significativas de dinheiro dos ávidos consumidores, também tenha tido alguns efeitos danosos no que diz respeito à efetividade dos resultados dos profissionais de informática. Podemos citar diversos exemplos de desperdícios no dia a dia das organizações, mas há alguns de caráter global que merecem ser avaliados. Vamos ao mundo fantástico da Internet. O principal apelo da rede é o conteúdo inesgotável de informações que podem ser obtidas a partir de cada micro doméstico acessando servidores no mundo inteiro. Pois, ao mesmo tempo em que a "WEB" talvez já seja o maior repositório de informações do planeta, talvez seja também o maior depósito de lixo de informações que se tenha notícia em todos os tempos. Quando digo lixo, refiro-me não apenas a conteúdos sem qualquer valia e aos quais por vezes somos submetidos por tecnologia "pushing" (estão jogando lixo no nosso quintal!), como também a conteúdos repetitivos armazenados milhares de vezes em locais diferentes. A Internet nos possibilita também observar um outro aspecto interessante que é o desperdício de esforço representado por programas de computadores absolutamente sem utilidade (observem que em alguns desses sites que permitem download existem vários programas que nunca foram baixados). Este último exemplo nos assusta quando vemos em organizações públicas e privadas alguns exemplos que repetem este sintoma bem visível na Internet.

Visando racionalizar o tempo das pessoas que tiveram a paciência de chegar até este parágrafo, concluo esta breve avaliação de cenário e resumo o desafio a todos nós envolvidos (e que também ganhamos dinheiro) com a informática, em dois pontos fundamentais:

  • Identificar e implementar novas soluções de Tecnologia de Informação em áreas de negócios e de serviços ainda carentes, principalmente visando avanços no campo das relações sociais;

  • Estabelecer e atingir novos e ambiciosos patamares em termos de produtividade e de qualidade.

Concluindo e comemorando os nove anos do nosso prestigiado Bate Byte, cumprimento a todos os envolvidos na sua elaboração e principalmente os colaboradores que enriquecem a nossa história da informática através de seus artigos, incentivando-os a que se sintam desafiados pelas propostas citadas anteriormente.