Flagrantes: Bugio fi-duma-égua / Bordoada no pintado / Pescador bom não dá mancada
Autor: Helio Hamilton Sartorato - GSO
E foi assim, dia após dia. Todo metido. O Terra Seca já estava abusando dos conhecimentos, metendo-se até a reconhecer os bichos pelo barulho que cada um fazia.
Belo dia, já se considerando mais entendido que o próprio piloteiro, que por sinal tinha nascido nas barrancas do rio e morou sua vida toda alí, o Terra Seca ouviu um som bem ao longe, rio acima, após uma curva. "UUUUUUUHHHHH..... UUUUUUHHHHHH..... UUUUUUUUUUHHHHHH...." Diz o cabra:
Bugio prá quem não sabe, é uma espécie de macaco lá do Mato Grosso, que anda sempre em bando e realmente faz um barulho danado. O piloteiro olhou pro céu e fez aquela cara de "ai meu Deus, que eu fiz prá ter que escutar isso". O parceiro, de tanto levar esbanjada já estava resignado com sua sorte. Lá pelas tantas, passados uns 5 minutos de UUUUHHH UUUHHH, o piloteiro com aquela cara de safo anuncia pro Terra Seca:
Era uma barcaça de carregar minério, muito comum no rio Paraguai. E a barcaça gritava: "UUUUUHHHHH... UUUUHHHHHH..." |
Bordoada no pintado Pescadores são todos amigos. Isso foi o que eu sempre ouvi dizer. Mas, depois de uma pescaria feita em Albuquerque, no rio Para-guai MS, descobri que o certo é : Pescadores são todos amigos, desde que estejam no mesmo barco. Eu tinha cinco dias para pescar com meu parceiro de barco, conhecido como Bacaiáu. O apelido não é pelo cheiro não, é que ele tem mania de tomar todas quando faz churrasco, e numa ocasião resolveu convidar a moçada para comer tainha salgada, tipo bacalhau, feita na brasa. Só que de tanta cana, esqueceu de pôr a tainha na água prá tirar o sal. Ficou jóia!! Voltando pro rio... A pescaria não estava lá aquelas coisas, tinha pouco peixe, mas no segundo dia descobrimos um poço, em que, sempre na última hora do dia, pegávamos 5 ou 6 pintados, sendo pelo menos um de bom tamanho. E era só naquela horinha. Não adiantava chegar antes, nem sair depois. Não me pergunte por quê. No último dia de pescaria, já no fim da tarde, tínhamos pego apenas um pintado pequeno que, por pouco, não dava medida (80 cm). Então, resolvemos ir tirar a forra em cima dos pintados do poço salvador. Era o último dia, a última hora, e um pintado grande teria gosto de gol aos 46 minutos do segundo tempo. Lá fomos nós. Quando íamos chegando no lugar, um barco passou a nossa frente e apoitou bem no pocinho. Nhaca!! Ficamos sem o gol. Meu parceiro "tava" a fim de jogar a caixa de pesca na cabeça dos caras. Eu pedi ao piloteiro que chegasse bem perto que eu queria quebrar a vara na cabeça de um.
O piloteiro levou nosso barco para o outro lado do rio, bem em frente aos adversários. Eu já achava que eram inimigos. Esperamos uns 3 minutos, então o piloteiro passou a mão no pedaço de pau que ele usava para sacrificar os peixes capturados, e pegou o nosso único pintadinho pelo beiço, levantou–o acima da cabeça e começou a encher a cabeça do coitado de porrada. Pou... Pou... Pou... Em seguida jogou o bicho no fundo do barco: Cataplumm!! O barulho era tanto que os caras lá do outro lado do rio estalaram o olho em cima da gente. O Bacaiáu só faltou pular no pescoço do piloteiro.
E assim foi. 4, 5 ,6 vezes. O pintado já estava destroçado. Em seguida, ligou o barco e subimos o rio uns 2 quilômetros. O Bacaiáu já não falava mais nada. Estava desolado. Eu concordava com ele. O piloteiro estava variando da bola. Paramos e voltamos devagar. Ao chegarmos de novo ao local, surpresa. Os adversários tinham saído do poço e apoitado bem no lugar onde o piloteiro tinha sofrido aquela crise de nervos. Aí que fomos entender a manha do peão. Como estavam longe, os adversários estavam achando que cada sessão de porrada era um novo peixe que era pego. Paramos no poço. Ficamos quietos uns 15 minutos e ta-rááá... começaram a bater os pintados. Por sorte logo entrou um grande que deu prá recolher. O piloteio então sentenciou:
Dito e feito. Os caras, lá do outro lado do rio recolheram suas tralhas e saíram fora. Deu tempo de ver um deles agradecendo a gente com a mão fechada e o dedo médio levantado, num claro desejo de boa sorte. |
Pescador bom não dá mancada Uma das delícias de uma pescaria com um grupo grande de amigos são, certamente, as patacoadas que acontecem. Como em nossas pescarias no pantanal cada barco leva 2 parceiros, a gente precisa, sempre ao final do dia, reunir-se para saber o que aconteceu em cada um dos barcos. Certa noite, após a pescaria, num certo quarto do hotel onde a turma se reunia para rir das gafes do dia, todos já tinham relatado as suas para deleite da tropa, quando adentrou o último pescador, recém-chegado do rio, carregando: caixa de pesca, salva-vidas, feixe de varas, etc. Alguém pergunta:
Crec, Crec, Crec, Crec, Crec, Crec,.... O ventilador de teto acabava de arrebentar as pontas de suas varas. |