Autor: Pedro Luis Kantek Garcia Navarro
Esta aconteceu de verdade. O dia: quinta-feira santa passada. O local: Aeroporto Hercílio Luz, em Florianópolis. A hora: 14:00.
Esperava eu o vôo 145 de Floripa para Curitiba. O aeroporto estava às moscas. Aliás, fazia um calor tão forte, que até as moscas tinham dado uma folga. Estavam fazendo a sesta até o sol baixar. Nisso, vem o aviso do alto-falante: "senhores passageiros do vôo 145..." e aquela coisa toda. Podiam ter economizado o uso do alto-falante. Era só avisar eu e mais os dois passageiros que iam embarcar comigo. Nisso chega o avião. Procuro uma palavra para descrevê-lo. Era um avião legal, bem pintado e... achei a palavra: um avião experiente. Com centenas de milhares de horas de vôo nas costas. Aliás, a tripulação também tinha cara de experiente. Uma comissária que falou comigo devia ter uns 45 anos de aviação.
Embarcamos todos (isto é, nós 3), o avião se dirige para a cabeceira da pista e,... lá vamos nós, sai a aeronave a correr desembestadamente, como só os aviões sabem fazer. Algo já me pareceu estranho na decolagem: o avião usou toda a pista e quase mais um pouco para subir. Eu, que já tenho um certo... digamos... receio para andar de avião, liguei minhas antenas. Faço uma pausa para uma declaração: tenho uma relação de amor-ódio com os aviões. Adoro vê-los e andar neles, mas depois que aquela geringonça se ergue nos ares, não vejo a hora de sentir a velha e boa gravidade atuando de novo sobre mim no chão do destino, naturalmente. Embora tenha lido muita coisa sobre aviões e aéreo-sustentação, continuo achando que aquilo tudo é bruxaria: só um milagre mantém aquelas toneladas todas no ar.
Bom, voltando ao nosso episódio, logo que o avião saiu do chão, uma curva inesperada à direita. Aquelas antenas que haviam sido ligadas, começaram a piscar. Nisso, o avião nivela a uns 500 metros de altitude e adentra mar adentro. Que diabos, ele nunca tinha feito isso. Começo a suar em parte pelo calor e em (boa) parte pelo inusitado da viagem ligo aqueles espirradores de ar que tem em cima das poltronas, no máximo. E, eu pensando, será que o avião não tem força para subir? E dê-lhe a sobrevoar o mar e as praias da ilha.
Será que vamos até Curitiba nessa altitude ? Assim vamos bater nas montanhas. A viagem até Curitiba é um pulo, é subir e descer, por que raios esse avião não sobe ?
Chegamos ao fim da ilha, e em vez de virar à direita, o avião vira à esquerda. E eu, já levemente desesperado: será que pegamos um motorista que não sabe o caminho ? Não sei não, acho que essa tralha vai se despedaçar no mar. Procuro logo o meu assento flutuante. De relance, vejo pela janela uma vista primorosa da Daniela (uma praia linda), mas quem vai se interessar por lindas praias quando está prestes a se encontrar face a face com o Criador ?
Olho para a tripulação em busca de sinais, mas aquela comissária (a dos 45 anos de experiência) está com uma face pétrea. O desespero bate em mim, estou a ponto de gritar: "pára tudo, quero descer - troco duas passagens de avião por uma da ônibus, de mano". E o avião continua baixo, o mar cada vez mais próximo, ... "socorro".
O alto-falante do avião dá um estalido e ouve-se "senhores passageiros, quem lhes fala é o comandante...", penso: É agora! É agora que ele vai avisar que estamos caindo... "crash, crack, zuoooiiimmm", estática e silêncio, o microfone caiu da mão dele. Tento levantar, mas o cinto de segurança me prende no lugar. Estou a ponto de derramar lágrimas de puro pavor, quando se ouve "senhores passageiros, boa tarde. Quem lhes fala é o comandante: espero que tenham apreciado nosso vôo panorâmico sobre as mais belas praias da ilha de Santa Catarina. Nos dirigimos agora para Curitiba, onde chegaremos em 20 minutos. Tenhamos todos uma boa viagem".
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