Flagrantes: As Mulheres e a Matemática ou a História de Sophie Germain
Autor: Pedro Luis Kantek Garcia Navarro- GAC
Através dos séculos as mulheres têm sido desencorajadas a estudar matemática. Apesar das dificuldades, houve diversas que se sobressaíram em seus campos. A nossa ciência (a informática) tem a "sua" mulher: Lady Ada, filha do poeta Byron. Trabalhando anos a fio com Charles Babbage, Ada escreveu o que viriam a ser os primeiros programas de computador da história. Isso em pleno século XIX, muito tempo antes de existir o primeiro computador. Hoje ela é homenageada com a linguagem ADA, em uso pelo Dod americano, entre outros.
Mas o assunto aqui é Mlle Sophie Germain, uma francesa, matemática da pesada, a quem se deve um importante trabalho na área da teoria de números. Há até uma família de números primos chamados Primos de Germain, na forma 2p+1, onde p também é primo. Na área da física, Germain desenvolveu a teoria da elasticidade dos materiais.
Sophie nasceu em 1776, filha de um negociante, bem de vida, mas longe da nobreza. Nessa época a matemática estava vedada às mulheres, mas como o assunto poderia surgir em um salão social, as mulheres tinham que ser treinadas para poder falar nisso. Surgiram assim obras que pretendiam explicar a matemática para o "cérebro feminino". Teve um livro de Francesco Algaroti que explicava o trabalho de Isaac Newton para mulheres. Como se pensava que estas estavam interessadas apenas em romance, o livro é um diálogo entre uma mulher e seu namorado. O homem fala dos princípios físicos, enquanto a mulher retruca com exemplos amorosos. Devia ser uma leitura chata pra burro.
Sophie se encantou pela matemática ao ler, em um livro, a vida de Arquimedes. Mais do que a vida, a morte de Arquimedes. Pois, já aos 70 anos, estava Arquimedes olhando uma figura geométrica desenhada na areia da praia, quando um soldado romano, participante das tropas que recém haviam invadido Siracusa, quis saber o que aquele velho estava fazendo. O velho dirigiu-se ao soldado e não fez nenhum caso da interrupção. Deve ter dito algo assim como "Não encha o ...". O soldado não se fez de rogado e meteu a espada na barriga de Arquimedes, matando-o.
Sophie pensou que se algo era tão absorvente e inebriante deveria valer a pena estudá-lo. Ela começou e, em breve, estava repassando os textos de Euler e Newton, escondida, antes de dormir. Quando o pai dela descobriu, passou-lhe uma carraspana, confiscando velas e agasalhos para que ela deixasse de estudar matemática; onde já se viu? Sophie reagiu escondendo uma porção de velas e enrolando-se na roupa de cama. Passava frio mas não deixava de estudar.
Em 1794 fundou-se a École Polytechnique em Paris. Templo do saber, existe até hoje, mas só tinha um problema: era só para homens. Sophie passou a frequentar a escola incógnita, vestida de homem. Apoderou-se da identidade de um ex-aluno, Monsieur Le Blanc. A escola não sabia que Le Blanc havia deixado Paris e continuou a imprimir resumos e exercícios para ele. Sophie escrupulosamente fazia os exercícios e devolvia-os à escola.
A coisa deu zebra quando o professor supervisor do curso, Joseph Lagrange (outro grande matemático) quis uma entrevista com Le Blanc. Como era possível que um aluno, que então, era uma anta, pudesse de uma hora para outra apresentar resultados tão maravilhosos? O que ele teria feito para aprender tão rápido e tão bem? Sophie foi obrigada a revelar seu segredo e foi um atônito, mas contente, Lagrange que passou a instruir e orientar "a" nova aluna. Saindo do já conhecido, Sophie começou a estudar áreas inexploradas da matemática. E sentiu necessidade de recorrer a Karl Gauss (há controvérsias, mas este aqui bem pode ser "o" maior matemático de todos os tempos). Com medo de ser rejeitada por Gauss, quem foi que assinou as cartas? Ele mesmo, M. Le Blanc.
A correspondência entre ambos ia de vento em popa, quando durante as guerras napoleônicas, o exército francês invadiu a Prússia. Sophie ficou com medo que seu guru tivesse o mesmo fim de Arquimedes, fosse morto por acaso. Falou sobre Gauss com seu amigo o general francês Pernety, que comandava os exércitos invasores. Este, impressionado pelo interesse de Sophie, fez questão de visitar pessoalmente Gauss, dizendo-lhe que sua vida estava salva graças a interferência de Mademoiselle Germain. Gauss tomou um susto, quem seria essa mulher?
Na próxima carta, o mistério se desfez: M. Le Blanc mudou de sexo de novo. Gauss respondeu com uma carta belíssima à Sophie, reconhecendo muito o trabalho dela, "ainda mais por ser mulher".
Mais para o final da vida, Gauss convenceu a Universidade de Goettingen a oferecer um título honorífico a Sophie Germain. Seria algo inédito, nunca antes uma mulher conseguira isso. Vencidas as barreiras, quando a universidade ia homenageá-la, um câncer a levou primeiro. Como final desta história, quando a Torre Eifel foi erguida, colocou-se uma placa com o nome de 72 cientistas franceses cujo trabalho permitira erguer aquele monumento. Sophie, cujo colaboração provavelmente foi a mais importante dos 72, não estava lá.
Através dos séculos as mulheres têm sido desencorajadas a estudar matemática. Apesar das dificuldades, houve diversas que se sobressaíram em seus campos. A nossa ciência (a informática) tem a "sua" mulher: Lady Ada, filha do poeta Byron. Trabalhando anos a fio com Charles Babbage, Ada escreveu o que viriam a ser os primeiros programas de computador da história. Isso em pleno século XIX, muito tempo antes de existir o primeiro computador. Hoje ela é homenageada com a linguagem ADA, em uso pelo Dod americano, entre outros.
Mas o assunto aqui é Mlle Sophie Germain, uma francesa, matemática da pesada, a quem se deve um importante trabalho na área da teoria de números. Há até uma família de números primos chamados Primos de Germain, na forma 2p+1, onde p também é primo. Na área da física, Germain desenvolveu a teoria da elasticidade dos materiais.
Sophie nasceu em 1776, filha de um negociante, bem de vida, mas longe da nobreza. Nessa época a matemática estava vedada às mulheres, mas como o assunto poderia surgir em um salão social, as mulheres tinham que ser treinadas para poder falar nisso. Surgiram assim obras que pretendiam explicar a matemática para o "cérebro feminino". Teve um livro de Francesco Algaroti que explicava o trabalho de Isaac Newton para mulheres. Como se pensava que estas estavam interessadas apenas em romance, o livro é um diálogo entre uma mulher e seu namorado. O homem fala dos princípios físicos, enquanto a mulher retruca com exemplos amorosos. Devia ser uma leitura chata pra burro.
Sophie se encantou pela matemática ao ler, em um livro, a vida de Arquimedes. Mais do que a vida, a morte de Arquimedes. Pois, já aos 70 anos, estava Arquimedes olhando uma figura geométrica desenhada na areia da praia, quando um soldado romano, participante das tropas que recém haviam invadido Siracusa, quis saber o que aquele velho estava fazendo. O velho dirigiu-se ao soldado e não fez nenhum caso da interrupção. Deve ter dito algo assim como "Não encha o ...". O soldado não se fez de rogado e meteu a espada na barriga de Arquimedes, matando-o.
Sophie pensou que se algo era tão absorvente e inebriante deveria valer a pena estudá-lo. Ela começou e, em breve, estava repassando os textos de Euler e Newton, escondida, antes de dormir. Quando o pai dela descobriu, passou-lhe uma carraspana, confiscando velas e agasalhos para que ela deixasse de estudar matemática; onde já se viu? Sophie reagiu escondendo uma porção de velas e enrolando-se na roupa de cama. Passava frio mas não deixava de estudar.
Em 1794 fundou-se a École Polytechnique em Paris. Templo do saber, existe até hoje, mas só tinha um problema: era só para homens. Sophie passou a frequentar a escola incógnita, vestida de homem. Apoderou-se da identidade de um ex-aluno, Monsieur Le Blanc. A escola não sabia que Le Blanc havia deixado Paris e continuou a imprimir resumos e exercícios para ele. Sophie escrupulosamente fazia os exercícios e devolvia-os à escola.
A coisa deu zebra quando o professor supervisor do curso, Joseph Lagrange (outro grande matemático) quis uma entrevista com Le Blanc. Como era possível que um aluno, que então, era uma anta, pudesse de uma hora para outra apresentar resultados tão maravilhosos? O que ele teria feito para aprender tão rápido e tão bem? Sophie foi obrigada a revelar seu segredo e foi um atônito, mas contente, Lagrange que passou a instruir e orientar "a" nova aluna. Saindo do já conhecido, Sophie começou a estudar áreas inexploradas da matemática. E sentiu necessidade de recorrer a Karl Gauss (há controvérsias, mas este aqui bem pode ser "o" maior matemático de todos os tempos). Com medo de ser rejeitada por Gauss, quem foi que assinou as cartas? Ele mesmo, M. Le Blanc.
A correspondência entre ambos ia de vento em popa, quando durante as guerras napoleônicas, o exército francês invadiu a Prússia. Sophie ficou com medo que seu guru tivesse o mesmo fim de Arquimedes, fosse morto por acaso. Falou sobre Gauss com seu amigo o general francês Pernety, que comandava os exércitos invasores. Este, impressionado pelo interesse de Sophie, fez questão de visitar pessoalmente Gauss, dizendo-lhe que sua vida estava salva graças a interferência de Mademoiselle Germain. Gauss tomou um susto, quem seria essa mulher?
Na próxima carta, o mistério se desfez: M. Le Blanc mudou de sexo de novo. Gauss respondeu com uma carta belíssima à Sophie, reconhecendo muito o trabalho dela, "ainda mais por ser mulher".
Mais para o final da vida, Gauss convenceu a Universidade de Goettingen a oferecer um título honorífico a Sophie Germain. Seria algo inédito, nunca antes uma mulher conseguira isso. Vencidas as barreiras, quando a universidade ia homenageá-la, um câncer a levou primeiro. Como final desta história, quando a Torre Eifel foi erguida, colocou-se uma placa com o nome de 72 cientistas franceses cujo trabalho permitira erguer aquele monumento. Sophie, cujo colaboração provavelmente foi a mais importante dos 72, não estava lá.