A Informação na Reforma Agrária
Autor: Jair Fernandes
Nos últimos dias, estamos assistindo esquentar o debate em torno dos sem-terra. Trata-se de pessoas buscando uma propriedade privada como meio de subsistência para sobreviver no campo. A questão é complexa e há, a meu ver, um equívoco que precisa ser esclarecido.
Assistia, tranqüilamente, a um desses telejornais noturnos e duas reportagens chamaram-me atenção: a primeira, falava do grande aumento da produção agrícola brasileira e a segunda, do grave problema social dos sem-terra. Há um paradoxo evidente nestes noticiários - a questão incomoda. Como podem aumentar a produção e a pobreza simultaneamente? Estas informações são, na verdade, sintomas do mundo real que denotam duas evidências claras: a primeira, diz respeito ao grave problema social do país, ancorado, óbvio, na incômoda disparidade na distribuição de renda. A outra, grita com todas as forças, que temos um novo cenário agrícola, onde as soluções tradicionais já não se ajustam adequadamente, ou seja, o discurso embasado no aumento da produção nacional através da distribuição das terras, deixou de ser verdadeiro.
Há, no coletivo, um discurso ortodoxo centrado na distribuição de terras como solução para o problema social no campo. A desapropriação de terras improdutivas pode não ter o efeito esperado, se não houver condições de competitividade para os pequenos produtores. Seria confortante imaginar que a lógica matemática tornar-se-ia verdadeira, assim, dividem-se as terras e obtém-se o esperado equilíbrio social. Mas, a realidade demonstra outro fenômeno e, muitas vezes, produtores são facilmente engolidos pela perversidade da "lógica" na economia de mercado. O problema, definitivamente, alojou-se no campo social e ético. A solução passa por pensar no sistema produtivo como um todo e, não mais, isoladamente.
As lideranças políticas precisam estar atentas às mudanças de cenários e, acima de tudo, dispor de flexibilidade suficiente para adaptar suas ações em um novo contexto. Caso contrário, as relações humanas serão resolvidas pelo único caminho que sobra, isto é, pela via intransigente da luta armada pela sobrevivência podendo, facilmente, desencadear uma avalanche de ódio coletivo, sempre causadora de guerras estúpidas e devastadoras. O aumento constante dos conflitos agrários demonstra claramente, a incapacidade das políticas públicas em equacionar os problemas advindos das atuais mudanças no cenário agrícola nacional. Outro aspecto importante a ser observado é da desestruturação do organismo formado pelas instituições governamentais, para atendimento às demandas do campo. Há uma necessidade premente de rediscutir o papel das instituições públicas no ambiente agrário.
Neste contexto, imaginar que se estaria fazendo reforma agrária distribuindo terras é um grande contra-senso, que somente poderia ajudar a diminuir algum sentimento de culpa frente às mazelas sociais que assolam o país. A hora é de se dar uma trégua na discussão saudosista, com soluções de caráter ideológico. A dita reforma agrária adquiriu, no mundo atual, um aspecto mais administrativo, o que impõe o repensar todo o sistema produtivo de maneira estratégica, oferecendo oportunidades para solução dos problemas sociais. O incentivo à agroindústria e atuações políticas visando o crescimento de centros agroindustriais, são maneiras de se reformular o sistema agrário, proporcionando melhores condições de sobrevivência no campo.
Há um aspecto que vem ganhando evidência na área, que é o conceito de Cadeia Produtiva. Encurtando o assunto, trata-se de analisar um produto agrícola em todo o seu ciclo, desde a tecnologia no preparo da semente e adubação, até chegar às estratégias de mercado para se atingir o consumidor final. Conhecendo os atores e as variáveis que formam o ambiente da cadeia, pode-se interferir em algum ponto considerado crítico. Assim, é possível, através de verdadeiras aplicações cirúrgicas, interferir na cadeia com políticas públicas eficientes, contribuindo, desta forma, para equilibrar a distribuição da renda entre os agentes do agronegócio e manter fortalecida toda a cadeia produtiva.
As modernas técnicas de plantio trazem um aumento considerável na produção. Desta forma, a inteligência trazida pelos órgãos geradores de conhecimento é fundamental para o aumento da produtividade no campo. Em outras palavras, pode-se produzir mais com menos terra, dependendo, claro, das técnicas utilizadas. Se a aplicação de tecnologia adequada é, cada vez mais, imprescindível no setor agropecuário, pode-se concluir, com segurança, que a informação no campo assume um caráter fundamental.
Existem, também, algumas iniciativas governamentais já voltadas para este novo cenário desenhado. No âmbito estadual, pode-se dizer que alguns programas de governo "pegam na veia". O estudo de Cadeias Produtivas, coordenado pelo IAPAR (Instituto Agronômico do Paraná), vem demonstrando bons resultados e permitindo uma leitura com caráter mais científico da realidade de mercado, dos principais produtos agrícolas produzidos no Estado. Há, também, os chamados PDR (Planos de Desenvolvimento Rural), que mapeiam o estágio de desenvolvimento rural de uma região e apontam novas oportunidades. Outro destaque nos programas de governo é a Universidade do Campo, que representa um marco diferencial nas ações governamentais conhecidas até então. A idéia é levar informação aos agentes do agronegócio de forma ágil e dinâmica. A estruturação do programa é postada em uma organização virtual sem estrutura física. Embora sem os tradicionais prédios monumentais, a Universidade do Campo está, gradativamente, tornando-se um agente importante na integração do conhecimento gerado pelos organismos inteligentes do contexto agropecuário estadual (Universidades Estaduais e Federal, institutos de pesquisa e demais instituições especializadas do setor). A união destas forças geradoras de conhecimento proporciona uma excelente oportunidade de aprendizagem, onde esses elementos podem transformar o ambiente atual e configurar um novo cenário para o setor agropecuário do Estado.
As transformações no campo social passam antes pela reformulação do sistema produtivo. Neste contexto, cabe ao Estado uma atuação centrada em políticas públicas, buscando o equilíbrio das classes produtoras, antecipando os grandes conflitos e proporcionando melhores condições de vida. O atoleiro em que se encontra o sistema agrário a nível nacional, demonstra a necessidade de uma revisão corajosa na atuação Governamental. Sem dúvida, é preciso muita coragem para abandonar algumas soluções ortodoxas e dedicar-se às soluções inovadoras.