A Informática no Brasil

Autor: Toshikazu Hassegawa

Apesar de sua quase permanente situação terceiro mundista, ao menos como usuário, o Brasil tem acompanhado de perto os países desenvolvidos na evolução do setor de computação. O mercado brasileiro de informática se constitui num dos mais expressivos do mundo (devemos estar situados entre os cinco maiores mercados), sendo importador de equipamentos desde o final da década de 50. No final dos anos 70, o governo brasileiro instituiu a reserva de mercado da informática, qualificando quatro empresas para a fabricação de computadores de médio porte, sendo uma estatal (COBRA) e as restantes da iniciativa privada (LABO, SID, EDISA).

Houve uma quinta empresa - SISCO - que, através de medida judicial conseguiu ser incluída entre as fabricantes nacionais. A tecnologia destes equipamentos, classificados como minicomputadores, foi adquirida nos Estados Unidos, França e Alemanha, sendo que durante alguns poucos anos o mercado de computadores de médio porte foi dominado por estas cinco empresas. Neste mesmo período, começavam a ser comercializados os primeiros microcomputadores e o mercado brasileiro tomou contato com estes equipamentos na feira de informática de 1980, ainda sem acreditar muito nestas máquinas de porte reduzido e, para a época, grande capacidade de armazenamento e processamento de informações.

Apesar deste ceticismo inicial, em pouco tempo, a exemplo do que ocorreu em outros países, estas máquinas se firmaram como padrão tecnológico e eliminaram do mercado as empresas que não tiveram capacidade de adaptação para alterar o mix de produtos, tendo sido substituídas por outras que, ignorando as restrições do governo, já estavam produzindo no País seus próprios equipamentos. Na verdade, dizer que estas empresas produzem computadores é uma afirmativa um tanto quanto temerária, uma vez que em sua grande maioria importam componentes, quando não placas inteiras, limitando-se a agrupá-las dentro de um gabinete. Não têm qualquer política de investimento em pesquisa e desenvolvimento - são meras montadoras.

A Informática e seu Contexto

A indústria da informática se situa nos dias atuais como uma das principais atividades empresariais no mundo, sendo tradicionalmente dividida em dois grandes segmentos: hardware, que são os componentes físicos de processamento, armazenamento e movimentação das informações, e software, que pode ser entendido como o conjunto de programas que determinam o quê e como os equipamentos produzirão um resultado.

Embora esta seja uma divisão tradicional e aceita por todos, nos dias atuais não pode mais ser tomada como absolutamente verdadeira, se considerarmos que, com o avanço tecnológico, cada vez mais a parte física incorpora componentes lógicos. Por outro lado, ao adotá-la estamos esquecendo de outros importantes segmentos dentro desta área - a robótica e a informática embutida, cuja face mais visível é a aviônica ou informática embarcada, presente nos aviões e naves espaciais. A participação destes na evolução tecnológica, não só como produtos, mas também como instrumentos de modernização dos processos, é, de forma crescente, com conseqüentes reflexos nos custos de produção dos bens e serviços.

O Papel dos Agentes

A informática, de acordo com a OECD (1986a: 59 (Table 2.11)), situa-se entre as que mais demandam pesquisa e desenvolvimento, tendo como contrapartida a geração em igual intensidade de novas tecnologias. Estes fatos a situam, conforme a classificação de David Kupfer no seu trabalho "Competitividade da Indústria Brasileira: Visão de Conjunto e Tendências de Alguns Setores", como um dos Setores Difusores de Progresso Técnico.

Entretanto, conforme cita Kupfer em seu trabalho, estes setores "foram os mais afetados pela instabilidade da economia brasileira, na medida em que a retração dos investimentos amplifica, para estes setores, a retração dos demais mercados [...] existe no País um nível satisfatório de capacitação produtiva e disponibilidade de recursos humanos qualificados em alguns segmentos, resultante do aprendizado acumulado por diversas empresas. Há, entretanto sérias dificuldades de articulação, seja na cadeia produtiva, com fornecedores de peças e componentes (destacando-se a debilidade do setor de microeletrônica), seja com clientes, fator fundamental para o desenvolvimento de produtos mais adequados às necessidades específicas dos usuários e indispensável para a elevação da competitividade tanto nos produtores como nos utilizadores de bens de capital.Em diversas empresas, principalmente na área de bens eletromecânicos, a falta de especialização leva à diluição de esforços em linhas muito diferenciadas de produtos e é excessiva a verticalização produtiva".

Pelos motivos já citados, no que a análise de Kupfer corrobora, certamente podemos creditar à indústria grande parcela do atraso tecnológico do setor. Não podemos esquecer todavia, que o principal objetivo de um empreendimento é o lucro e, sendo assim, nenhuma empresa adotará uma política de investimentos em pesquisas e desenvolvimento sem que haja uma contrapartida em forma de incentivos do Estado. Como esclarece Klaus Esser "o papel do governo nesse diálogo é gerar impulsos, coordenar e direcionar. [...] O que é necessário é uma política estrutural ativa, antecipatória e baseada em diálogo, que emerja da interação intensiva entre os parceiros e que seja estabelecida de maneira a desenvolver e integrar a vantagem competitiva nacional. (ou regional)".

Cabe, portanto, ao Estado, não só promover a alocação de recursos através de uma política de incentivos, mas também atuar como parceiro em algumas iniciativas, tendo neste caso, as Universidades como um dos instrumentos de ação. Uma parceria entre as empresas, detentoras do capital e do mercado (e portanto conhecedora de suas necessidades) e as Universidades, detentoras do conhecimento, pode resultar em redução significativa do gap tecnológico. Por outro lado, o financiamento e a compra pelas empresas da tecnologia produzida pode reduzir a crônica falta de recursos das instituições de ensino estatal. Obviamente, serão necessários alguns ajustes no conteúdo de alguns cursos, por vezes excessivamente acadêmicos quando não divorciados do mercado, adaptando-os e tornando-os mais flexíveis às exigências da demanda.

Novos Desafios

Quando se fala da indústria da informática, sempre vem à mente a fabricação de equipamentos. Trata-se de um segmento importante, mormente pelo aspecto de agregador de tecnologia. Entretanto, como citamos no início, é apenas um dos segmentos desta área. Por razões desconhecidas, no Brasil o segmento de software permanece apenas como complemento da indústria de máquinas.

A grande e esmagadora maioria do software produzido no País é voltada para solução de problemas administrativos específicos, nas empresas e órgãos públicos - os aplicativos -, sendo a parcela realmente rentável - os de base (sistemas operacionais, compiladores, editores de texto, etc.) - importada em quase sua totalidade. Se considerarmos que este setor, pelo baixo investimento que exige (tecnologia, basicamente), é um dos mais rentáveis da atualidade, com elevado valor agregado, estamos deixando de lado uma grande oportunidade de desenvolver uma atividade que, com certeza deverá ser uma das bases da nova revolução industrial que se vislumbra e ignorá-la será fechar os olhos para o momento histórico de um dos grandes avanços.

Bibliografia

PEREZ, Carlota. Cambio tecnico, reestruturacion competitiva y reforma institucional en los paises en desarollo; Santiago do Chile: ILPES, Documento L/6, p. 1-48, 1989.

MACEDO, Mariano de Matos. Experiências de desenvolvimento em contextos de integração econômica. Campinas ; Instituto de Economia / UNICAMP, 1994. Tese de Doutorado.

KUPFER, David. Competitividade da Indústria brasileira: visão de conjunto e tendência de alguns setores. Revista Paranaense de Desenvolvimento, p. 45-78, 1994.