Masculino e feminino nas organizações

Autor: Luiz Fernando Ballin Ortolani


Conforme afirmam os estudiosos da mitologia grega, Homero caracterizou o herói Ulisses de formas diferentes em seus poemas Ilíada e Odisséia do ponto de vista histórico. Interessa-nos neste artigo analisar os valores adotados para o herói e para sua esposa, Penélope.

Segundo a mitologia, Ulisses amava inicialmente Helena, princesa espartana, cujo número de pretendentes era excessivo e, "indisposto" a uma luta pelo seu convívio, desviou sua atenção para Penélope, por coincidência prima de Helena, o que lhe trazia benefícios equivalentes em termos de riqueza e poder.

Afastado de Penélope durante o decurso da Guerra de Tróia (dez anos), retorna ao lar e encontra a sua esposa fiel para viverem um grande amor.

No mito, Ulisses é o guerreiro jovem, valente, inteligente, diplomata, vencedor, essencialmente prático pelos seus interesses (riqueza e poder) quando se casa com Penélope, que, apesar dos apelos do pai para residirem em Esparta, vai morar com Ulisses na longínqua ilha de Ítaca. Imputa-se a ela o símbolo da fidelidade conjugal pela espera do marido.

O que se deseja destacar nesta narrativa são os valores associados ao homem e à mulher.
Continuando sobre os estudos da mitologia, o que comumente se questiona ou se destaca é o comportamento de Penélope, mas não de Ulisses, quanto à fidelidade, apesar do número de filhos adulterinos do herói, o que sinaliza que, àquela época, adultério era do gênero feminino.

Com certeza, tanto o mito quanto os estudos sobre a mitologia de Homero apresentam evidências que realçam o masculino como positivo, tornando-se um "prato cheio" às feministas.

Analisando-se com maior atenção, constata-se que a grande maioria das organizações atuais possuem uma estrutura associada à família patriarcal, originária da cultura judaica, com alto grau de masculino. Isto significa que os valores adotados por este tipo de organização são essencialmente masculinos e, se esse é o valor fundamental, despreza-se, atenua-se ou elimina-se os valores opostos, explicando, em muitos casos, a discriminação de mulheres e de homossexuais em certas organizações.

Como muito do que é válido para o indivíduo é ampliado para o grupo e também para as organizações, analisando os valores masculinos associados ao pai, pode-se estendê-los à organização.

O pai, em geral, é o cabeça da família patriarcal. Suas decisões são respeitadas e consultadas antes de qualquer membro proceder a uma ação. Força, coragem e heroísmo, "perfumados" por auto-admiração narcisista, são freqüentemente valorados como qualidades que o pai espera de seu filho. O pai também atua como mentor para auxiliar e proteger o filho.

Analogamente, na grande maioria das organizações modernas, com estrutura organizacional hierárquica na forma de pirâmide, as decisões são tomadas de cima para baixo ou efetua-se consulta ao "pai" para desenvolver alguma ação. O "pai", encarnado na figura do chefe ou proprietário, espera de seus filhos (subordinados) força, heroísmo e coragem, trazendo resultados positivos para a organização. Membros do alto escalão também freqüentemente cultivam paternalmente regras, agindo como mentores para aqueles (filhos) que necessitam de ajuda e proteção.

Em relação aos outros seres vivos, o ser humano nasce muito menos amadurecido e preparado para enfrentar os problemas relativos à sua sobrevivência. A condição mais imatura do recém-nascido humano coloca sobre a mãe uma grande dependência, influenciando a formação da personalidade desde os primeiros instantes da vida. As atitudes da mãe para com o filho provocam respostas de prazer ou desprazer no organismo infantil com efeitos duradouros na sua concepção da realidade.

Independente da comunicação verbal, a mãe compreende o significado das comunicações do filho e supre sua necessidades, alimentando-o e protegendo-o. Isto se deve aos valores psicológicos femininos, também denominados matriarcais: amor incondicional, otimismo, confiança (no sentido de lealdade), compaixão, intuição, criatividade e felicidade.

Avaliando estes valores no ambiente organizacional, descobre-se, por exemplo, que falta felicidade nas organizações porque são muito rígidas em sua maioria (masculina); que para mulheres é mais difícil punir do que para os homens (punir o filho); que o otimismo é relacionado às mulheres porque são bem-humoradas, quem é mal-humorado é o homem.

Observando-se a literatura recente, destaca-se a intuição como um fator importante na administração. As estratégias das empresas e o planejamento correspondente não podem mais ser executadas fundamentando-se exclusivamente nos aspectos lógicos e racionais, face à crescente instabilidade e mudança do ambiente empresarial.

As organizações baseadas em valores matriarcais (femininos) seriam mais independentes em termos de autoridade (menos hierárquicas), com valores sobrepondo metas, mais tolerante às falhas humanas e abertas à criatividade. Tais valores são evidentes em organizações não burocráticas.

A propósito, a primeira organização burocrática nos moldes atuais foi o exército de Frederico o Grande, da Prússia, responsável pela unificação dos estados alemães, atualmente parte da URSS, Polônia e Alemanha. Seu melhor amigo de infância foi fuzilado à sua frente por ordem de seu pai. A partir deste episódio, mudou suas características. Tornou-se autoritário, organizador e conquistador, desejos inicialmente de seu pai (vontade do pai, característica de família patriarcal). Entre os conceitos introduzidos por Frederico destacam-se: treinamento (especialização na atividade), unidade de comando, amplitude de controle, distinção do pessoal de linha e de staff comuns nas organizações burocráticas.

Nelas, destacam-se o racional, o analítico e o instrumental, características associadas ao estereótipo masculino na cultura ocidental, e ofuscam-se habilidades tradicionalmente vistas como feministas tais como: intuição, educação e suporte enfático. As mulheres que se destacam neste tipo de organização reprimem ao máximo sua feminilidade. Em função do cargo que ocupam, passam a pensar e agir como homens, ou seja, para o sucesso, faz-se necessário um processo de masculinização.

Outra abordagem quanto às características de masculino e feminino nas organizações diz respeito à individualidade e considera distinções entre cultura ocidental e oriental. O homem em sua essência exige individualidade e isolamento, enquanto a mulher é mais social pelo fato de ser mais receptiva, o que lhe facilita trabalhos de equipe. A diferença cultural deve ser levada em conta porque a cultura ocidental é muito mais pelo trabalho individual, ao passo que a cultura oriental é extremamente funcional para trabalho em grupos.

Destaca-se ainda o fato que apesar de uma predominância da estrutura patriarcal na maioria das organizações modernas, existem nichos "reservados" para a mulher assumir o papel do pai. Em geral as instituições filantrópicas são destinadas às mulheres. Nelas, os níveis diretivos são ocupados por mulheres e o nível operacional por homens.

A análise do masculino e do feminino nas organizações, inserida na interpretação da relação organização e família patriarcal, é uma abordagem dentro de um contexto maior da Teoria das Organizações pela metáfora das organizações como prisões psíquicas.

Valores masculinos e femininos podem ser adequadamente combinados para criar organizações mais tolerantes às falhas humanas, menos hierárquicas e mais flexíveis que permitam adaptação rápida ao ambiente competitivo e velozmente mutável que caracteriza nossos dias.

Referências bibliográfias

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