Um Celepariano entre Mickey, Pateta e Donald
Autor: Pedro Luis Kantek Garcia Navarro
Filhos adolescentes em ponto de bala, a chance de desenferrujar um pouco o parco inglês; um dinheirinho guardado no bolso, e lá vamos nós para 10 dias de Disneyworld. Curitiba, São Paulo e Orlando, num avião imenso que mais parecia um jardim de infância, tamanha a balbúrdia e o alarido que vigiam lá dentro.
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A chegada, o aluguel de um possante Mitsubishi hidramático, direção hidráulica, só faltava o motorista virtual, a imediata perda no trânsito maluco da cidade, achar o hotel, dormir e no dia seguinte, bem cedo, aquele parque do castelo da Cinderela: Magic Kingdom. O parque é muito bonito, se bem que acho que 1/3 da humanidade pensa a mesma coisa e estava lá. Vazava gente pelo ladrão. Aliás, se perguntarem o que mais eu fiz em Orlando, responderei na bucha: entrar em filas. Tinha fila pro ingresso, pro brinquedo, pro trem, para comer, para estacionar, para fazer xixi, tinha fila até para fazer fila. |
No meio da manhã, a primeira confusão idiomática: Vou a uma lanchonete, buscar comida pros três. Fico contente, estou sendo entendido pela vendedora, nosso diálogo é produtivo. No meio do papo, a mulher sem mais nem menos dispara: french, italian or russian. Que aconteceu ? Meio desnorteado, tento a mesma frase, e a mulher retruca do mesmo jeito. Que remédio, o negócio é mudar de idioma, meu inglês deve estar bem ruinzinho, e como lá todos falam espanhol, mudo para este. A mulher repete, agora num espanhol perfeito: frances, italiano o russo. Credo, que fazer ? Português, nem pensar. Meu francês é bem fraquinho, Italiano e russo, pior ainda. E a mulher perdendo a calma e levantando a voz. Me dá o desespero: cála-te mulher enlouquecida, pensei, vade retro. O que queres de mim ?
Já íamos quase ao destempero verbal, quando ela, vendo que eu não ia entendê-la nunca, chacoalha uns envelopinhos diante de mim. Ai, que vergonha. Ela não queria mudar de idioma, só estava perguntando qual molho de salada eu queria. Tinha o francês, o russo e o italiano. The italian, respondo, que ainda por cima era low fat (diet).
Pausa para falar da refeição. O que se desperdiça de coisas, não está no gibi. Aliás, se me pedirem uma definição da sociedade americana, dá para falar sem medo de errar: é a sociedade do desperdício. Com o objetivo de economizar em mão de obra, tudo, absolutamente tudo, é descartável. Isso implica em jogar fora uma quantidade imensa de coisas. Para quem vem de uma sociedade pobre, que precisa de empregos (aliás como todo o mundo, inclusive o 1º ) e ainda por cima sabe que os recursos deste nosso pobre planeta são finitos, dá uma coisa bem ruim, vendo esse festival de fim de festa.
No dia seguinte, um passeio para compras. Conhecendo-me, procurei me manter afastado de lojas de informática, que se eu bobear, acabo comprando um caminhão dessas tralhas. Mas, nosso cérebro (ou pelo menos o meu) caminha por caminhos tortuosos, e quando dei pela coisa, sem querer estava dentro de uma imensa loja de computadores. Inesperadamente, acabei encostando a barriga no balcão dos notebooks e lá tinha um que era uma lindeza. 8Mb de memória, vídeo colorido, 1Gb de disco, drive de 3 1/2, bem levinho, pela pechincha de 995 dólares.
Pronto. Já me arrependi de ter entrado na loja. Agora, se não compro, vou ficar a vida inteira me lastimando. E, se compro, arrumo mais uma tralha inútil. Afinal, em casa, o índice de computadores per capita já é maior que 1, todos ligados em rede, e o que vou fazer com este ? Só se instalá-lo no banheiro, que ainda não está servido por recursos computadorizados. Pra encurtar a história, pelo sim pelo não, comprei o micro. Voltei para o hotel e deixei ele ligado, para ver se agüentava, com a secreta esperança de que ele não me decepcionasse.
Passada uma noite, ele tinha pifado. Não sei se ficava contente ou triste. Juntei tudo e voltei pra loja. Depois de alguma conversa, desfizemos o negócio. Foi um alívio, um peso a menos a carregar, e até agora não tinha entendido para que ia usar o tal do notebook. Os céus ouviram minhas preces.
Outro dia, fomos ao Parque da MGM. Lá tem um brinquedo, concorridíssimo, no qual um elevador (com você dentro, é claro), despenca do 12º andar até o terceiro. Mais de uma hora de fila, autêntica Babel (alemão, holandês, português – tinha até uma mulher com uma camisa com o Roberto Carlos desenhado – inglês, espanhol, árabe, e ainda por cima uns idiomas que francamente não dava para identificar). E a porta do elevador se aproximando, e a minha, ou melhor, nossa coragem cada vez menor. Até que, finalmente, chegou a vez. Não consegui entender, o que leva um ser humano, supostamente no gozo de suas faculdades mentais (isto é, eu) a entrar numa geringonça que vai ser atirada de mais de 40 metros de altura, e ainda por cima PAGAR por isso. Bom, com a porta fechada, não havia o que fazer, a não ser relaxar. Só um pouquinho antes da coisa começar a se mexer, meus pensamentos se voltaram aqui para a Celepar. Pensei, temos que ver o lado bom de tudo na vida. Quem sabe isso me dá mais experiência para usar os elevadores no 1142... .
Mais alguns parques, passeios (o Cabo Cañaveral é muito lindo, um pântano imenso em volta cheio de cartazes com "dangerous, there are many poissons snakes here") e chega a hora de voltar para Curitiba. Muitas horas de vôo, e cá estamos no belíssimo Aeroporto de Curitiba. Todos inteiros, uns quilinhos mais gordos, satisfeitos da vida e prontos para o recomeço.
Mas, pensando bem, que o micrinho era uma beleza, isso era.